O cão é………….
A relação Homem/Cão é tão forte, quanto antiga. Uma relação que ninguém sabe ao certo como e quando nasceu. Sabe-se no entanto que os moldes de então são os mesmos seguidos na actualidade: amizade despretensiosa e sincera.
É nessa relação que o homem moderno, encontra o seu lado mais primitivo e mais instintivo. É, também, nessa relação que o cão encontra o sabor de ser possuído, de ser dependente de alguém, e a alguém ser fiel, e comportando-se através de condicionalismos básicos e primários.
Nessa convivência Homem/Cão, encontramos a relação inicial de uma longa doação e afectividade. Observemos um cão diante do seu dono: o afecto, carinho, obediência, organização, respeito e amizade, fidelidade que sentimos nesse contacto, não sentimos em relação nenhuma Homem/Homem. Nas relações humanas, onde se diz o homem ser um Ser Racional, não existe tanta homogeneidade de comportamento. Porque foi travada uma relação nesses moldes é fácil deduzir que há uma inerente insatisfação de afecto no homem já antigo, quanto mais o moderno. Uma necessidade muito grande de dar e receber, uma necessidade muito grande de ser, pura e simplesmente. O ser fluindo do interior de maneira rica e pura. Como na relação Cão/Homem o envolvimento afectivo é muito grande de ambas as partes, suprindo assim essa carência. Não há por isso racionalização de afectividades, não há competição e não há portanto outros interesses, a não ser dar e receber prazer. Ê a busca de prazer. O prazer de ser. O prazer de receber afeito, obediência e fidelidade. O prazer de ter no cão a compreensão e o carinho desinteressado. Através de um cérebro constituído por irrigações primárias, um cão mostra ser inteligente e perspicaz, o que de certa forma gratifica ainda mais o homem. O que ele sente através das suas emoções quase básicas, demonstra-o honestamente, não se reveste de máscaras nem de comportamentos aceites ou não. Ele é. Ele reage, pura e simplesmente. Se for um animal tratado correctamente pelo seu dono, as suas atitudes serão coerentes e ele mostrar-se-á tranquilo frente a qualquer situação. O seu comportamento vem de um processo de condicionamentos simples. O cão assimila tudo que lhe é demonstrado. O cão assimila e reage conforme padrões dele, puros, emoção pura, e não de padrões pré estabelecidos por uma sociedade ou um grupo. Dai a coerência do animal.
Para cada cão, existe por trás uma personalidade. As vezes forte, às vezes fraca, mas sempre uma cabeça humana comandando e agindo. De um cão e do seu comportamento poderemos chegar sem medo de errar a um perfil da personalidade do seu dono, do ambiente em que vive, sobre as relações entre as pessoas que convivem com ele no seu ambiente, ou de como ele é ou não amado; ou de como ele é ou não respeitado.
Como as pessoas são limitadas nos seus relacionamentos e nas suas aspirações de vida e sistemas de valores, elas jogam para cima do animal a espera de uma gratificação. Quando ela vem, eles tomam a vitória como se fosse sua, quando não vem, culpam o cão. Usam o cão para sua auto afirmação. Fazem dele o seu herói ou vítima ou vilão. Brigam em nome dele, usam-no, travam guerra em prol dele. Por acaso já tentaram analisar se ele - cão - quer? Por acaso já se analisaram e perceberam o quanto se tornam ridículos em torno de um animal que só quer ser amado e respeitado?
O homem esquece, na sua sabedoria (?) que é eternamente responsável por aquilo que cativa. E depois de cativado através de necessidades básicas de sobrevivência, ele deve cultivar o que cativou. Aliás, isso é muito comum entre as pessoas. O animal que está ali, sempre por perto, esperando um afago ou comida, com aqueles olhos apaixonados com que olha o dono, está também querendo dizer: "Cativa-me por favor". Está sempre para o dono, quer estar sempre com o dono, entrega-se ao dono para o que der e vier. Ë sempre um doador por excelência, dando tudo de si e na maioria das vezes recebendo o que não faz falta ao seu senhor dono. Efectivamente a troca de amizade e afecto é feita sempre em débito, porque o homem dá-lhe o que não lhe faz falta e exige-lhe o que o cão muitas vezes não tem. Coloca nessa relação as suas frustrações e reflecte no cão os seus problemas diários de relacionamentos e falta de afectividade. O homem de hoje muito preocupado com o status (poder e ter), não sabe que o que lhe falta está em si mesmo e fica procurando fora as suas compensações. Então, o cão usado como mecanismo de defesa às limitações do homem, é manipulado e domado sem conhecimentos básicos de relações ou afecto.
Nunca o afecto que uma pessoa dá ao cão vem de acordo ou é normal. Ou é de mais a ponto de torná-lo um neurótico canino ou é de menos a ponto de torná-lo um carente por excelência. Porque as pessoas nunca são coerentes consigo mesmas. Como o serão com os seus cães? Porque as pessoas nunca estão preocupadas em ser, mas sim em ter e parecer. E o cão? Ê. Ele é, embora, apesar de, em todas as situações.
Usam os animais para "tapar o Sol com a peneira", para encobrir as suas falhas e aspirações por vezes doentias. Usam-no para aparecerem, para se auto afirmarem perante a vida, pois com ela - a vida, já se sentem brigados há muito. Será que não percebem que nada disso tem tanta validade e que o que realmente é válido é o amor do seu cão, que o que é gratificante é a doçura do olhar do seu cão, ou a sua obediência? Sugiro que as pessoas pensem no mal que estão a fazer a si mesmas ou a outras pessoas em prol de um cão, ou mesmo da Cinofilia. Sugiro que deixem de ser ridículas e a exemplo do seu cão, se tornem mais coerentes nas suas atitudes. Devemos aprender com o cão coisas que não aprendemos durante a trajectória da vida. Ele é. Pura e simplesmente ele é. E viver não é ser?