Acho que se está aqui a fazer alguma confusão entre comportamentos inter-especificos.
Quando se fala em comparações Homem/macaco, o termo macaco é muito vago.
Dentro dos primatas o Homem é actualmente o único representante do seu género: Homo, e da família dos hominídeos. Todas as outras espécies estão extintas na presente época.
O termo “macaco” tanto pode ser atribuido a um cercopiteco, primata muito primitivo no grupo dos macacos, como a um chimpanzé, espécie muito mais semelhante aos humanos em todos os aspectos.
No entanto o chimpanzé (tal como o gorila, o orangotango, o bonobo e o gibão) é um antropoide e não um hominídeo. Ou seja, para alem de não ter nada a ver com a nossa espécie ( embora parente próximo á escala da evolução natural) nem sequer pertence á mesma família em termos genéticos e de sistemática.
Os estudos apenas mostram algumas semelhanças com um “parente” suficientemente afastado, nunca podendo pôr em pé de igualdade as duas espécies.
Com o lobo e o cão isso não se passa. Continuam a ser a mesma espécie – Canis lupus.
Um lobo ártico, um lobo cinzento, um Pastor Alemão, um pinscher e um dingo continuam a ser a mesma espécie. As duas 1ªs são consideradas sub-espécies ou raças naturais uma vez que a sua diferenciação ocorreu na natureza devido a afastamento geográfico. As 2 ultimas são raças domésticas, manipuladas durante milénios pelo homem de modo mais ou menos artificial ( de acordo com os padrões de selecção deste). O ultimo trata-se de uma raça (ou tipo) domestica que se tornou selvagem há cerca de 4000 anos.
Hoje em dia o cão doméstico cientificamente já não é considerado uma espécie de canídeo aparte (Canis familiaris) mas sim uma variante (ou um conjunto de variantes) domesticada do lobo (Canis lupus familiaris). Genéticamente o cão doméstico continua a ser um lobo com as alterações fisicas e comportamentais inerentes ao longo processo de domesticação.
A grande diferença apontada (pelo menos a maior), reside no facto dos cães manterem durante toda a vida comportamentos tipicos de cachorro. Se formos ver as diferenças entre um lobito e um cachorro em termos de comportamento, são practicamente nulas. A grande diferença surge quando o animal atinge a idade adulta. Por isso muitos cientistas costumam designar o cão doméstico como “lobo infantilizado”. Ou seja, nunca cresce suficientemente em termos psiquicos de modo a tornar-se independente, sendo o dono para ele como a extensão da própria mãe.
Comportamentos tão normais nos nossos cães, tais como ir buscar coisas, disposição para brincar, abanar a cauda freneticamente, demonstrações efusivas de afecto, etc., são comportamentos normais em lobos jovens que vão desaparecendo á medida que vão atingindo a maturidade. Nos cães essas características mantêm-se. Alterámos o comportamento dos lobos domésticos em nosso benefício, chegando mesmo a neutralizar algumas características com vista a potenciarmos outras (quando um sentido diminui, outro aumenta a sua capacidade). Ao longo de milénios fizemos isso de modo mais ou menos consciente, de tal modo dizem alguns que quase criamos uma nova espécie. Os cães também acabaram por se adaptar de tal modo aos humanos que acabaram por tirar partido dessa relação quase simbiótica.
No que respeita aos cães nórdicos, estas características foram algo limadas mas não tanto alteradas como na maioria das raças.
Continuam a ter tal como os lobos uma hierarquia bem estruturada dentro da matilha, mantendo muito melhor o seu equilibrio emocional e psiquico em conjunto do que como individuos isolados ( os problemas de comportamento que conheço em cães nórdicos referem-se a “filhos unicos”).
Raramente chegam a confrontos que envolvam sangue para manter o seu lugar na matilha. O 1º impulso é abocanhar o pescoço e colocar o desafiante em posição de submissão.
Tal como nos lobos, torna-se problemático aceitarem um elemento estranho na matilha que não seja submisso. Mas caso mostre atitudes de submissão, a agressividade é automaticamente neutralizada e o novo membro é aceite desde que se integre na posição omega.
Outra das características é o uivo, breve mas contagiante para todos os membros da matilha que colaboram num coro bem sonoro com a finalidade de reforçar os laços familiares.
No entanto embora estabeleçam a sua hierarquia na matilha, desde o alpha ( normalmente o mais dominante ou o que melhor tira proveito das situações) até ao omega (normalmente o mais submisso ou então o mais jovem) todos reconhecem o dono (e o homem em geral) como “super-alpha”, abafando qualquer tipo de agressividade para com ele.
Algumas vezes podem confundir o dono com um dos elementos da matilha de nivel mais baixo e tentar medir forças na liderança ou na posição hierárquica, normalmente através da típica rosnadela. Qualquer tentativa de imposição deve ser neutralizada colocando o cachorro em causa em posição de submissão até que ele deixe de se debater e passe a aceitar isso como dado adquirido. O dono tem que ser visto como uma espécie de “Deus” inatingível em termos hierárquicos. Mesmo os mais dominantes, acabam por perceber o seu lugar, raramente havendo respostas de agressividade ( comigo ainda não aconteceu).
Mas o mais importante é impormo-nos pelo respeito, ou seja nem sempre o melhor alpha é o mais forte ou mais agressivo ou mesmo mais dominante, muitas vezes é o mais adaptável ás situações (inteligente), das quais beneficia o resto da matilha, ganhando o respeito da mesma. Perceber que somos nós os mais inteligentes, proporcionando bem estar a ele e á matilha e que somos indestronáveis enquanto “super-alphas” acho ser fundamental para um relacionamento equilibrado, estável e duradouro por parte do cão connosco.
Como cão que cresce ”mentalmente”, um Malamute nunca entenderá grande parte do treino “normal” que é efectuado a outros cães simplesmente porque o acha ilógico para seu beneficio e da matilha. Quando lhe atiramos uma bola para ir buscar, fica sério a olhar para nós como quem diz: “para que raio quer ele que vá buscar aquilo? , o que é que isso contribui para o meu bem estar e do meu clã?, isso são coisas de putos para treinar a trazer alimentos, eu já sou adulto e aquilo não se come!”.
Se o fizer, fá-lo contrariado e apenas numa atitude de submissão extrema.
Talvez por isso muitas pessoas não entendam os cães nórdicos e os alcunhem de burros.
Pelo contrário, a sua inteligência leva-os a discernir o que na realidade faz ou não sentido e lhe é util, tal como os lobos.
Neste contexto, basicamente concordo com o Pedro, não vejo que não se deva agir com os cães tendo em conta o comportamento dos lobos. Afinal eles AINDA são a mesma espécie.
Também penso que o cão nos vê como um da sua espécie, no entanto com uma capacidade de lhe proporcionar a sobrevivência e o conforto que nos torna num alpha incondicional. Tal como um lobo domesticado, se este for dominante, também irá tentar disputar a liderança com o dona várias vezes durante a sua vida. Alguém se recorda da história verídica do “LIK” na Croácia?
É o caso flagrante de dominância inter-especifica.
Inter-especifica do nosso ponto de vista, do ponto de vista do lobo seria intra-especifica.
Penso que a maioria dos cães problemáticos se deve á confusão adquirida durante a sua adolescência sobre qual é o seu lugar na “matilha” humana. Na maioria das vezes deve-se a casos de tentativa de “humanização” que acabam por confundir completamente o cão.
O importante não é o cão dormir ou não connosco, ficar ou não no sofá, ter este ou aquele mimo. O importante é fazer-lhe perceber que fará isso QUANDO nós queremos e nunca lhe dar hipótese de desafiar a nossa posição de líder (super-lider). E a grande maioria dos cães instintivamente faz isso. Na maior parte das vezes nem percebemos que somos lideres.
Desculpem o testamento

