A Ciclagem e as 1ªs Semanas do Aquário
Texto original por DUDU1
As primeiras semanas de um aquário novo são fundamentais para o seu sucesso. Antes de pensarmos em povoar os nossos aquários, devemos preocupar-nos em preparar a casa para os futuros peixes.
Para proporcionar uma vida saudável no nosso mini-ecossistema formado por vidros, devemos preparar ''a casa'' para os peixes.
Os alimentos não consumidos, as fezes, dejeto dos peixes e qualquer outra matéria orgânica que se acumule não vão desaparecer por magia do aquário. Serão decompostos por microorganismos, muitas vezes resultando em substâncias tóxicas.
Mas como a natureza tem um jeito para tudo, existem seres transformam essa matéria decomposta em outros compostos que poderão ser novamente aproveitados por outros seres. Uma das mais importantes classes de compostos que resultam da decomposição são os nitrogenados, e o processo pelo qual eles são gradativamente transformados chama-se Ciclo do Nitrogénio.
Como e quem é responsável por esta transformação? São seres microscópios chamados bactérias nitrificantes, cuja função na natureza é decompôr os compostos nitrogenados. Quando montamos um aquário novo, as bactérias só existem em quantidades mínimas (aquelas poucas que por acaso vieram junto com a água, com o cascalho, etc.).
Portanto é fundamental, nas primeiras semanas, fazer com que esta colónia de bactérias se multiplique até atingir uma quantidade que seja capaz de processar os dejetos dos peixes que virão a seguir. Assim, dependemos da formação de uma boa colónia de bactérias nitrificantes para que possa haver uma vida saudável nos nossos mini-ecossistemas (aquários).
Na linguagem da aquariofilía, esse período inicial de formação da colónia costuma chamar-se ''ciclagem do aquário''. Um aquário só estará pronto para receber a população principal de peixes quando estiver devidamente ciclado. Este processo normalmente leva entre 3 a 6 semanas.
Como funciona este ciclo? O nitrogénio (N) é um elemento químico que entra na constituição de duas importantíssimas classes de moléculas orgânicas: proteínas e ácidos nucleicos. Embora esteja presente em grande quantidade no ar, na forma de gás nitrogénio (N2), poucos seres vivos assimilam-no nessa forma.
Apenas alguns tipos de bactéria, principalmente cianobactérias (antigamente conhecidas como algas azuis ou cianofíceas), conseguem captar o N2, utilizando-o na síntese de moléculas orgânicas nitrogenadas. Essas bactérias são denominadas fixadoras de nitrogénio. Eles são comidas por outros organismos, que por sua vez são comidos por outros animais, e assim por diante até que os compostos nitrogenados estejam espalhados por todos os seres vivos.
Quando esses compostos nitrogenados são liberados, (pela morte de um organismo, ou parte dele, ou pelas suas excreções), eles são processados por bactérias decompositoras, e um dos principais produtos dessa decomposição é o gás amoníaco (NH3). O amoníaco, em contato com a água, forma o hidróxido de amoníaco (NH4OH), uma substância altamente tóxica que em grandes concentrações tem o efeito de uma base altamente corrosiva. O amoníaco é uma substância muito perigosa para os peixes, e a sua toxicidade depende da temperatura, do pH (acidez) e da salinidade da água. Por exemplo, quanto mais ácido for o pH, mais hidróxido é neutralizado e portanto diminui a toxicidade do amoníaco. Por outro lado, quanto mais alcalino o pH mais perigoso é o amoníaco. Felizmente, essa substância é consumida por bactérias do género Nitrosomonas, que na presença de oxigénio transformam o amoníaco em Nitrito (NO2-) obtendo energia através do seguinte processo:

O HNO2 (ácido nitroso) dentro da água dissolve-se liberando o ião nitrito (NO2-). O nitrito é mais uma substância altamente tóxica para plantas e animais, mas felizmente ele também não se acumula num aquário bem montado, pois logo as bactérias do género Nitrospira tranforma-no em Nitratos (NO3-), também obtendo energia pela reacção:

Agora sim, o nosso nitrogénio que partiu das moléculas orgânicas decompostas finalmente assumiu uma forma bem menos tóxica. No aquário, o nitrato vai lentamente acumulando como resultado desse processo. Mas não devemos deixá-lo acumular muito porque isso acaba por levar ao crescimento excessivo de algas que o aproveitam como nutriente. Para evitar isso, fazemos regularmente trocas parciais de água e, melhor ainda, colocamos plantas naturais no aquário, pois o nitrato é prontamente consumido por elas. Aliás, as plantas também são boas consumidoras de amoníaco, e portanto ajudam muito a manter essa toxina sob controle.
As bactérias nitrificantes ir-se-ão fixar em qualquer local onde haja uma boa oxigenação (visto que o processo principal do ciclo é aeróbico, ou seja, com a presença de oxigénio). Porém, as colónias serão mais prósperas em locais onde não haja muita luz, e onde a corrente de água não as moleste em demasia. Esta é a parte mais importante do Ciclo do Nitrogênio em termos de aquarismo, mas na verdade ele não pára por aqui. Por exemplo, se faltar oxigênio na água o Nitrato pode ser transformado novamente em nitrito ou então, por um processo chamado denitrificação, ele volta a ser transformado por bactérias anaeróbicas em nitrogênio gasoso (N2), e o ciclo fica completo.
Agora que sabemos como é o Ciclo do Nitrogénio, podemos entender melhor como devemos proceder num aquário novo para garantir um ambiente saudável para os peixes. O processo de colonização dessas bactérias ocorre sem que seja necessária a sua intervenção, basta que haja uma fonte de matéria orgânica. Uma vez montado o aquário, colocada a água e ligados os filtros, precisamos fornecer um pouco de amoníaco para dar início ao processo de ciclagem. Às vezes a própria água de torneira já vem com amoníaco, mas em geral é melhor incentivar o processo. Mais uma vez, uma óptima maneira de começar é colocando plantas naturais. O seu próprio metabolismo e as folhas que caem fornecem o nitrogénio inicial, e como já dissemos elas ajudam a evitar que o nivel de amoníaco suba demais. Também se pode colocar uma pitada de ração, ou um pequeno pedaço de peixe ou camarão, e existem produtos comerciais incentivadores do ciclo. Outro procedimento é usar um pouco de cascalho e/ou água de um aquário já maturado, que esteja seguramente em boas condições.
É muito comum colocar "peixes cicladores" para acelerar o processo também. Acrescenta-se uns 2 ou 3 peixes resistentes (paulistinhas, por exemplo) para viver no aquário enquanto este está a passar pela ciclagem. Não obstante, este procedimento não aconselhável devido ao stress que causa nos peixes.
O ideal é comprar um kit de testes completo de água doce (pH, NH3, nitrito, nitrato) e acompanhar as subidas e descidas da amoníaco e do nitrito.
Quando o nitrito cair a zero depois de ter subido, o aquário está pronto para iniciar a colonização dos peixes. Mas mesmo assim a população deve ser aumentada gradualmente, para permitir que a quantidade de bactérias também se vá adaptando ao aumento da carga biológica.
Por: Carlos Eduardo Coraza
Editado por: Peixazul