durante 14 anos partilhei a minha vida com uma cadela que não era chata. Com as visitas sim, era uma melga, achava que todos os seres humanos (excepto os que usavam muletas, bengalas ou guarda chuvas...) eram bons e dignos do seu amor. Era uma cadela que gostava do seu espaço, que EU ia cumprimentar quando chegava a casa porque a rainha-mãe estava na sesta...

acompanhava-me para todo o lado, sabia estar, nunca me destruiu nada.
Mas... a perfeição não existe, claro: a Tonta, além de alergia à picada da pulga, tinha várias dermatites alérgicas; tresandava a cão, nos dias de chuva o odor podia considerar-se arma química, deitava muito pêlo o ano inteiro, por mais que escovasse, era demais. Tinha um focinho lindo, mas umas orelhas estupidamente grandes, um corpo de pastor alemão com nanismo, uma cor lobeira e cauda curta em forma de pincel... Não era uma cadela bonita. Quando ficou velhinha, além de cega e surda, paralisou e ficou também muito senil. Nos momentos de lucidez, o seu olhar era de profunda infelicidade: sempre tinha sido autónoma e agora ali estava ela, dependente de mim para lhe fazer chegar comida e água, trocar-lhe a roupa da cama e lavá-la por não conseguir levantar-se para xixis e cocós, por se assustar com o meu toque. Precisei de uma semana para conseguir ter coragem de a levar à ponte do Arco Íris, foi a decisão mais difícil de toda a minha vida. Partiu com cerca de 18 anos, estve comigo desde os seus 4, era de rua, lutou por entrar em casa e conquistar o seu lugar, dando provas de um amor como nunca senti noutro ser. Soube conhecer-me e fazer-me compreender que era a cadela da minha vida.
Hoje tenho mais gatos do que cães, e há de tudo: bravos, medrosos, meigos, melgas e carrapatos... alguns são até meio esquizo e acumulam tudo isto
Eu também aprecio muito um animal independente, até porque suportam melhor se nos perderem. Não cultivo a dependência, acho-a nociva, mas pode educar-se um animal de modo a não o tornar dependente de nós. o ideal é mesmo o que disse a Elsa, adoptar um animal adulto ou adolescente, dar-lhe a atenção que pode e não a que ele demanda e proporcionar-lhe muitos estímulos além da sua pessoa, abrir-lhe horizontes...

E, se apesar disso, se tornar um cão chato... estou certa que terá paciência e o aceitará como ele é até se esquecer que ele é um chato e garantir que só é chato com as visitas...

Acredito na Paciência, na Persistência, no Pai Natal e no Poder do Fiambre!