Kikas bebé

Sempre foi um canito muito engraçado, patinha curta e arqueada, focinho achatado pois é cruzado de pequinois, com o seu feitio e teimosia mas muito meigo. Sempre se deu bem com gatos, era levá-lo à rua e os gatos a roçarem-se nele. Também sempre foi sociável com cães mas se eram de porte grande armava-se em valente e rosnava como costuma ser hábito dos cães minorcas.
Desses tempos de juventude do Kikas a menina recorda com saudade quando ia para a rua brincar com os vizinhos depois das aulas e o Kikas andava pela rua a passear à vontade com a sua amiga Kibutsi e o Carraçudo. Havia também outros canitos da vizinhança a Ema, a Bessi, o Duque, o Puccini, o Pantufa, a Fofinha e a Beauty. Todos esses amigos já partiram há muito tempo. Todos os canitos dessa época são estrelinhas há mt.
A menina lembra-se também quando os donos da Fofinha (parecida ao Kikas) propuseram que o Kikas com 2 anos fosse uns dias namorar com ela. Felizmente não aconteceu nada. Na altura os donos do Kikas não pensavam como pensam hoje em dia, que o que menos falta faz são mais cachorrinhos neste mundo para mais tarde serem abandonados.
O Kikas foi um cãozinho muito viajado, para todo o lado onde os donos foram o Kikas ia, fosse de carro, comboio ou barco. Só lhe faltou andar de avião e quando os donos em 2001 foram à Madeira uma semana o Kikas não comeu e levou a olhar para a porta donde sairam.
Kikas na Serra da Estrela 2001?

O Kikas sempre foi um cão saudável, além de uma obstrução intestinal devido a um osso e uma outra infecção urinária esporádica. Um sopro cardíaco e cataratas e menor visão, assim como menor audição foram coisas que a idade trouxe mas nada de mais.
Kikas com 10 anos





Kikas com Xaninha

Em Janeiro de 2009 com 15 anos o Kikas teve uma obstrução urinária com pedras na uretra e apesar da idade foi um valente. Foi operado, fez uma uretrostomia ou seja o xixi passou a sair por um buraquinho perto donde estavam os testículos (foi castrado com 15 anos) e começou a fazer xixi à menina. Tinha de ser para desobstruir e evitar uma recidiva. Correu tudo bem felizmente, embora com infecções urinárias mais frequentes.
A menina e o Kikas na Foz do arelho em 2002

Já há tempo que o Kikas fisicamente não estava aquele cão lindo de pêlo lustruso e brilhante com rabo enroladinho em cima do dorso. Pelo fraco e feio, rabo sem piada, olhos baços, parte traseira sempre rapada para evitar o cheiro a xixi, mas para a menina crescida continuava lindo.
Em Setembro passado o Kikas esteve um bocadinho em baixo e começou a tomar medicação diária para o coração. Há 3 semanas esteve outra vez muito em baixo com desidratação, mas com soro arrebitou. Com leishamaniose e dirofilária negativas, hemograma mais ou menos (ligeira anemia e glóbulos brancos baixos) fez-se o teste de hemorparasitas que deu hemobartonelas e raquésia. Além do comprimido diário para o coração, era um outro de 12 em 12, outro de 24 em 24 e outro de 48 em 48. Foi muito complicado seguir à risca a medicação (houve bastantes falhas) pois a cabeça dos seus pais já não é o que era e a menina, agora mulher, há 2 anos que já não morava com os pais e o Kikas e outros bichinhos, tendo ela própria em casa muitos bichinhos para tratar pelo que por vezes se esquecia de ligar a lembrar da medicação. Na altura a resposta da veterinária à pergunta se era melhor o Kikas estar nos pais ou com a menina crescida a resposta foi "onde ele se sentir melhor". Ora onde ele se sentiria melhor foi onde sempre viveu.
Os últimos meses do Kikas não foram fáceis. As medicações, a comida que era suposto ele comer e nunca foi boa boca, a incontinência, o estar atento a qualquer coisa, o apercebermo-nos da senilidade. O Kikas por vezes andava pela casa sem destino só por andar. Era capaz de dar meia dúzia de voltas à mesa da cozinha, sem razão aparente. Lembrava aqueles idosos no lar que se levantam (e ainda bem que se levantam) e vão andando pela casa feito tontos. Por vezes ficava de pé apalermado a olhar para uma parede ou um canto da divisão.
Ontem o pai liga a dizer que achava o Kikas muito mal e a menina crescida disse logo para levar para a vet. Como não podia sair de imediato do trabalho ligou à vet a saber como ele estava e não ouviu muito optimismo. A menina à hora de almoço foi vê-lo e não estava à espera do que viu... Com dificuldade em respirar, a gemer, olhos abertos, inconsciente e sem reacção, a soro e a oxigénio. Pouca esperança davam... Mas a menina crescida ainda tinha alguma, afinal o Kikas sempre foi um valente.
Eram 17.30 e o telefonema. A menina crescida chorou, chorou e chorou. A menina crescida culpou-se de não o ter levado para sua casa onde o tratamento seria seguido à risca (mas teria feito diferença?). A menina crescida por um lado sabe que qualquer dia seria o dia que teria um desgosto, mas tem tendência a culpar-se de tudo e a querer carregar com tudo nas suas costas. A menina crescida queria ter estado mais presente nos últimos tempos de vida do seu Kikas. A menina crescida chora de desespero por nunca mais poder ver o seu velhote lindo. Foram companheiros por mais de metade da sua vida, desde os 11 aos quase 28, foi o mano que nunca teve.
A menina crescida ontem esteve no trabalho até tarde a chorar e a ganhar coragem e o ir buscar e depois foi levá-lo ao sítio onde ele agora descansa. Daqui a bocadinho vai fazer uma visita e apanhar pedrinhas na ribeira para pôr à volta do espaço do seu Kikas. Tem uma vista bonita e é um sítio calmo no campo.
A menina crescida está inconsolável pois era o seu Kikas, o seu menino. E pela sua vida já passaram muitos outros meninos que foram para outras famílias. Mas o Kikas é o Kikas, o irmão que nunca teve, o cão da sua vida e que nunca esquecerá. E dói muito.
Última foto do Kikas

Descansa em paz meu velhote!
20/05/1994 - 22/02/2011