Pet Hoarders

Pedidos de ajuda, de animais, entre outros devem ser feitos neste fórum. Aqui reflecte-se também sobre a adopção, o abandono e possíveis contributos para lutar contra este flagelo.

Moderador: mcerqueira

TheOne
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quarta jul 13, 2011 2:09 pm

Terugkeren3 Escreveu:No caso que refere, uma pessoa que adopta um animal sem ter condições financeiras para o adoptar e recorrendo a ajuda de terceiros, penso que não caberá na minha definição alargada de “Animal Hoarder” se o fizer apenas uma vez . Se o fizer de forma reiterada e recorrente, já começo a pensar que sim. Podemos-lhe chamar irresponsável ou outras coisas mais, mas Hoarder não me parece.
De resto, da mesma forma, penso que não caberão na classificação de um comportamentos obsessivos/compulsivo as pessoas que fazem aqui pedidos de ajuda monetária para fazer face a uma situação esporádica e urgentes de ajuda a um animal. Sobretudo casos em que estamos perante um animal cuja ajuda foi devidamente ponderada do ponto de vista racional. Agora quando for alguém que encontra animais a precisar de ajuda em cada esquina que dobra, e para todos eles abre pedidos de ajuda porque necessita de apoio monetário, e em poucos ou nenhum deles sabe muito bem qual vai ser o futuro do animal, ou sequer se tem futuro….alguma coisa está mal.
Sem mais nem ontem. :wink:

Não sei porquê eu já sabia que o desenrolar desta conversa ia "tombar" para este lado 8)
"Eu sou responsável pelo que digo, não pelo que você entende." - Auto desconhecido

"O maior prazer de uma pessoa inteligente, é fazer de idiota perante um idiota a fazer de inteligente!" - Autor desconhecido
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 2:12 pm

TheOne Escreveu:
Terugkeren3 Escreveu:No caso que refere, uma pessoa que adopta um animal sem ter condições financeiras para o adoptar e recorrendo a ajuda de terceiros, penso que não caberá na minha definição alargada de “Animal Hoarder” se o fizer apenas uma vez . Se o fizer de forma reiterada e recorrente, já começo a pensar que sim. Podemos-lhe chamar irresponsável ou outras coisas mais, mas Hoarder não me parece.
De resto, da mesma forma, penso que não caberão na classificação de um comportamentos obsessivos/compulsivo as pessoas que fazem aqui pedidos de ajuda monetária para fazer face a uma situação esporádica e urgentes de ajuda a um animal. Sobretudo casos em que estamos perante um animal cuja ajuda foi devidamente ponderada do ponto de vista racional. Agora quando for alguém que encontra animais a precisar de ajuda em cada esquina que dobra, e para todos eles abre pedidos de ajuda porque necessita de apoio monetário, e em poucos ou nenhum deles sabe muito bem qual vai ser o futuro do animal, ou sequer se tem futuro….alguma coisa está mal.
Sem mais nem ontem. :wink:

Não sei porquê eu já sabia que o desenrolar desta conversa ia "tombar" para este lado 8)
Não há qualquer tombar de coisa nenhuma. É uma situação recorrente e até a mim já me fizeram esse pedido. Tivesse eu possibilidades de tempo e logistica e aceitaria.
Não vejo o porquê do comentário.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
<p>Tourada n&atilde;o &eacute; tradi&ccedil;&atilde;o, &eacute; crueldade- Assine aqui, divulgue e ajude a acabar com esta viol&ecirc;ncia</p>
nicosa
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quarta jul 13, 2011 2:16 pm

Não sei se concordo contigo, Lu, no meter no mesmo saco o pet hoarder e o net hoarder.
Há diferenças substanciais , é verdade. O pet hoarder acaba por maltratar os animais e neglegenciá-los. E, acima de tudo, não conta com ninguem. Porque se acha sózinho no mundo. E acha que só dele depende a " salvação" dos animais que encontra a vadiar.
O " net hoarder" não os negligencia, é verdade. Mas, e como tu concordas e por várias vezes te li já contra, tambem não se pode dizer que os trata bem. Como tu mesma já disseste muitas vezes " enfiar um animal num hotel ad eternum" não é ajudá-lo" antes pelo contrário. E este depende de terceiros. E não me digas que não achas um comportamento compulsivo e a necessitar de ajuda uma pessoa que sabe que não suporta , fisica, moral, financeira e psicologicamente , a responsabilidade de nem mais uma pulga e mesmo assim coloca ás costa dela e dos outros responsabilidades enormes.
Assim como não coloco no mesmo saco aqueles que não suportam nem mais um piolho em fat , mas por " moleza" de coração ou por não saberem dizer não , admitem que lhes enfiem pela porta dentro tudo o que seja cão ou gato que as chamadas " almas caridosas" arrebanham nas ruas.
E tambem não cabe , para mim , no mesmo saco aqueles que têm um , dois ou três animais , sempre puderam e conseguiram ser responsáveis por eles mas, por qualquer volta da vida , deixam de o poder fazer.
Já aqui assistimos, neste site mesmo e nestes subforuns , a muitas histórias destas. Enquanto tópicos destes servirem para nos fazer pensar , são muito bem vindos.
Sofia
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 2:20 pm

Nicosa, aconselho vivamente a reler o que escrevi. O resumo que fizeste é de tal forma descontextualizado que nem vou comentar. Talvez se citares algumas das minhas intervenções, eu perceba onde pretendes chegar.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
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nicosa
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quarta jul 13, 2011 2:31 pm

Contextualiza-te lá!

LuMaria Escreveu:Não há confusão de conceitos?

Um pet-hoarder maltrata animais. Não os alimenta ou fá-lo deficientemente. Não há cuidados de higiéne ou veterinários. Não há asseio. Entre alguns outros. Não é por querer salvar o mundo inteiro e pretender palmadas nas costas que alguém é pet-hoarder. Mais importante que debater o que é um pet-hoarder, apesar de nitidamente haver confusão no conceito, é debater como se podem ajudar os animais e as pessoas. Ambos são vitimas.
LuMaria Escreveu:
Espero que depois de se definir o que é um pet-hoarder, não se ponha toda a gente no mesmo saco, simplesmente porque tem diversos animais, ou tentar salvar diversos animais, ou porque simplesmente é contra o abate.
LuMaria Escreveu:Um pet-hoarder maltrata animais. Não pode atribuir maus tratos a outro tipo de compulsões. É incorrecto. Por muita volta que lhe queira dar.
Já lá chegaste? :wink:
Sofia
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 2:32 pm

nicosa Escreveu:Contextualiza-te lá!

LuMaria Escreveu:Não há confusão de conceitos?

Um pet-hoarder maltrata animais. Não os alimenta ou fá-lo deficientemente. Não há cuidados de higiéne ou veterinários. Não há asseio. Entre alguns outros. Não é por querer salvar o mundo inteiro e pretender palmadas nas costas que alguém é pet-hoarder. Mais importante que debater o que é um pet-hoarder, apesar de nitidamente haver confusão no conceito, é debater como se podem ajudar os animais e as pessoas. Ambos são vitimas.
LuMaria Escreveu:
Espero que depois de se definir o que é um pet-hoarder, não se ponha toda a gente no mesmo saco, simplesmente porque tem diversos animais, ou tentar salvar diversos animais, ou porque simplesmente é contra o abate.
LuMaria Escreveu:Um pet-hoarder maltrata animais. Não pode atribuir maus tratos a outro tipo de compulsões. É incorrecto. Por muita volta que lhe queira dar.
Já lá chegaste? :wink:
Não. Lamento. Faltam os teus comentários por baixo.
Também não sei o que é um net hoarder. Sorry.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
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LuluB
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quarta jul 13, 2011 3:09 pm

Não personalizemos a discussão. O importante é isto:
liliana28 Escreveu:O conceito de obsessivo/compulsivo está a ser simplificado neste tópico. ...
De facto, está-se a simplificar o conceito que está na base do comportamento do pet hoarder. E não há formas "modernas" de hoarding, tal como os objectos da obcessão/compulsão não são só os animais.

Tentar definir em A, B ou C um comportamento já desviado também não é tarefa para leigos, muitos deles demonstrando tendências que outros leigos podem classificar de desviantes, ou desviados. E a mesma carapuça que enfia nuns pode perfeitamente encaixar-se noutros. Por isso, deixemos esse caminho, que não leva a parte nenhuma.

Sob pena de este tópico vir a transformar-se na tal guerrinha suja de fim-de-semana que me leva a não querer participar nele. A mim e com certeza a muitos mais.
<p>Ol&aacute;, eu sou a Bronkas de outros f&oacute;runs e aqui j&aacute; fui a LucNun. :mrgreen:</p>
<p>&nbsp;</p>
<p><strong>Cada vez me conven&ccedil;o mais que h&aacute; pessoas que t&ecirc;m o intestino ligado &agrave; testa.</strong> - "By" algu&eacute;m que tem ambas as coisas no seu devido lugar. :mrgreen:</p>
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 3:12 pm

LuluB Escreveu:E a mesma carapuça que enfia nuns pode perfeitamente encaixar-se noutros
Ficou perfeitamente demonstrado.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
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Chamarrita
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quarta jul 13, 2011 3:31 pm

Olá. Chamo-me Susana e, tecnicamente, sou uma pet-hoarder.

Muitos dos meus comportamentos incluem-se no conceito, que é considerado um distúrbio psiquiátrico, uma neurose obsessivo-compulsiva/ distúrbio de ansiedade. Tem tratamento, mas não tem cura. Por algum motivo, mais recente ou mais remoto, foi criado um vazio emocional que a todo o custo é necessário preencher, porque é um vazio que não fecha, e traz um grande sofrimento à pessoa que dele padece.

Ao contrário de outras obsessões/compulsões (viver para o trabalho/a carreira, ser activista de direitos humanos, ser artista, seguir a vida monástica, entre outros), esta - a de viver com um elevado número de animais, sacrificando aquilo a que chamam "vida pessoal" - é socialmente inaceitável. A família desaprova, os amigos afastam-se. Talvez sintam que deixou de haver lugar para eles. E a "maluquinha dos gatos de dos cães" fica cada vez mais só e mais livre para exercer a sua "loucura". A CatLady dos Simpsons é um bom exemplo desta perturbação em "roda livre".

Voltando a mim, e apesar de ainda não ter atingido tais extremos, uma vez colado o "rótulo" é difícil retirá-lo. E os gatos/cães tornam-se os bodes expiatórios sobre os quais recaem todas as culpas, são a eles atribuídas as causa de todos os "problemas"... Toda a situação é vista pelo lado negativo e passamos a vida a dar "desgostos" a quem nos quer bem, a desiludir, a frustrar expectativas.

No meu caso, o problema de vazio/ obsessão/ ansiedade não é de agora, embora o "acumular" de animais seja relativamente recente. Desde bebé que me lembro de adorar animais e sempre os ter tido como companheiros na solidão de uma infância de filha única. Um de cada vez, e sempre cães.

Imagem

O Chuchu foi o "meu" primeiro cão. Na verdade não era meu, era da minha tia, com quem eu passava os dias até a minha mãe deixar de trabalhar e passar a viver em função de mim, numa profissão de "mãe a tempo inteiro". O Chuchu era o meu grande amigo e protector, chamava a minha tia quando eu acordava, roubava brinquedos e chupetas a outros bebés quando ia à rua e oferecia-mos. Mas eu era muito pequenina e as lembranças que guardo, conscientes, resumem-se a fotografias, histórias que me contaram e alguns brinquedos que resistiram ao tempo. Mais tarde tive os meus próprios cães: o Paco, rafeiro amarelo teimoso como um burro que nunca conseguiu aprender a andar de trela e que desapareceu (porque os meus pais achavam bem que o cão andasse na rua sozinho...); o Pluto, cruzado de cocker, inteligentíssimo, oferecido ao meu pai "com as vacinas" mas sem nenhum boletim de saúde, e veio a morrer com esgana, ainda bebé. Durante mais de meio ano tive pesadelos e chorei pelo meu Pluto. O terceiro cão que tive com os meus pais foi um "acanichado", o Black, resultado de uma conspiração com o meu pai (e contra a vontade da minha mãe, que nunca gostou lá muito de animais e sabia que ia "sobrar" para ela...). Com o Black, sendo eu mais velhinha, já pude responsabilizar-me um pouco e garanti, com o dinheiro que me davam, a vacinação completa e anual. Jurei, depois do Pluto, que nenhum animal a meu cargo morreria ou viria a sofrer por doenças perfeitamente evitáveis, e a promessa mantém-se cumprida. O Black morreu com 13 anos, suspeito que tenha sido cancro, pois os meus pais recusaram a necrópsia. Eu já não estava em casa, comecei a trabalhar cedo e, quando recebi a notícia, já tinha sido enterrado. No fim de semana antes da sua morte tentei convencer os meus pais a adormecê-lo, mas não tiveram "coragem", nunca o tinham feito, não iriam fazê-lo e não consegui impôr-me. Não sei se é ou não verdade, mas contaram-me, com confirmação de uma vizinha, que o Black morreu a dormir. Eu estava no meu primeiro ano de serviço, a dar aulas pela primeira vez, e não podia faltar "por causa de um cão". Mais um juramento feito: que nenhum animal meu iria sofrer esperando pela morte.

Dois anos mais tarde surgiu aquela que foi a minha grande companheira de longos anos, a Tonta. Baixinha, comprida, de pata curta, orelhas enormes, fugia de uns garotos que a apedrejavam e veio ter comigo. Protegi-a, dei-lhe água, mas não comida, porque isso significaria "assinar um contrato" para o qual ainda não estava preparada. Mas a minha senhoria, que vivia no andar de baixo da casa que eu tinha alugado, tratou do assunto, e a cadelinha ficou por ali. Como a alimentação era de restos, comecei a comprar-lhe ração, mas havia o problema dos fins de semana, em que ia a Coimbra, e os meus pais não queriam lá a cadela. Ainda se fosse macho... :roll: Preocupada, tratei de lhe arranjar um dono, e um colega aceitou ficar com ela. Só que... passados poucos dias a Tonta fugiu, e veio ter comigo outra vez. Fui escolhida e não havia nada a fazer. O meu colega devolveu-me os seus pertences e eu levei a Tonta ao veterinário, para iniciar o plano de vacinação e a assumir como "minha". Tomou a sua banhoca (foi um festival, com duas pessoas a segurarem enquanto eu tentava lavá-la) e passou a entrar em casa e permanecer. Sempre foi uma "senhora", uma cadelinha exemplar. A família acabou por aceitá-la, apesar de tresandar a cão e largar pêlo como nunca vi. Depois de 3 anos comigo e algumas pseudogestações e injecções para evitar o cio (sabia lá eu das esterilizações...), acabou por ter uma piómetra - emprenhou, sei lá eu como, e os fetos mumificaram - e foi esterilizada. Long story, que a Tonta viveu comigo 14 anos, foi ao meu casamento, assistiu ao meu divórcio, enfim... uma vida longa, e ajudei-a a partir no dia 10 de Outubro de 2007.

E até agora, nada de gatos, não é? :)

Embora eu ache que ser filha única terá sido um pequeníssimo contributo para ser hoje uma catlady, conheço imensa gente com irmãos, com filhos, enfim, sem nenhuma razão válida para o sentimento de solidão. E eu, na verdade, nunca me senti sozinha, embora me sinta muitas vezes incompreendida... mas aprendi a viver com isso.

No último ano de vida da Tonta, depois ter sido submetida a uma mastectomia parcial devido a tumores, com cerca de 18 anos de idade, estava em vias de me "amigar" com um moço que sempre tinha sido "dos gatos". Comecei a pensar em adoptar uma gatinha, apesar de sempre ter sido "dos cães", mas alguns gatos passarem fugazmente na minha vida e sempre me tinham fascinado. Só que a minha família não gostava de gatos (traiçoeiros, falsos, etc) e por isso nunca tive grandes oportunidades de convívio, além de ter uma série de preconceitos e ideias erradas sobre estes seres admiráveis. E, um belo domingo de Maio, estava eu na barraquinha da AZL, na feira anual de Leiria, apareceu um casal com um saco de gatos - literalmente, um saco de serapilheira - com cerca de 2 mesitos. Eram 5 e bastante engraçadinhos, excepto uma "trombudazinha" que ficou num canto da jaula a olhar para mim, enquanto os irmãos brincavam e lutavam pela atenção de uma das voluntárias. Acabei por pegar na trombuda ao colo, ela subiu para os meus ombros e meteu-se no capuz do casaco, onde adormeceu. A tarde passou, tinha de ir para casa e tencionava devolver a gata à jaulinha, mas quem diz q ela me largou? Olhou para mim, bem dentro dos olhos, e miou "mamã". Juro. E com ela assim, de unhas espetadas no meu peito, foi comprar uma transportadora em vime na barraquinha ao lado, e levei a Chamarrita para casa. E a minha vida mudou... 8)

O moço veio lá dos Açores, amigámo-nos mas as coisas não correram muito bem. Em Outubro, com o falecimento da Tonta, a Chamarrita ficou sozinha e os problemas começaram. Ele não queria a gata a andar pela casa toda (a MINHA casa, onde ele era convidado), e fechava-a quando eu ia trabalhar. Comprámos uns sofás XPTO, que a Chamarrita começou a arranhar APENAS na presença dele, e fui percebendo que ele valorizava mais as coisas do que os afectos. Ela provocava-o indecentemente, e fez com que se fosse revelando... até que um dia me deu a escolher: "ou eu, ou a gata!". E eu fiz a escolha certa, claro...

Logo no início desse ano de 2008, e porque a Chamarrita me foi ensinando a conhecer e amar os gatos, conheci e registei-me num fórum vizinho, o Felinus, para aprender um pouco mais. No princípio de Março, logo no 1º dia, o rapaz foi "desconvidado" e recambiado para a saia da mãe, de onde nunca devia ter saído e, nessa mesma noite, comecei a procurar um companheiro para a minha gatinha, que iria ficar sozinha grande parte do dia. Encontrei: um gato pardo, tigrado, grande, muito, muito meigo, com cerca de 2 anos, que havia sido "vendedor de castanhas" na baixa de Lisboa. Fui buscá-lo e conheci a sua FAT, uma dessas "maluquinhas dos gatos" que "dava sentido à vida" resgatando animais da rua, mas afinal... era uma pessoa "normal", um ser humano fantástico, uma mulher equilibrada e sã, culta, que conseguia perfeitamente conciliar a sua vida social e profissional com a ajuda aos animais, e "independente", apesar de cooperar com associações diversas. Desde logo ganhou a minha amizade e admiração.

Mas, poucos anos antes, já a minha vida e as minhas perspectivas tinham começado a mudar, mesmo antes da Chamarrita ter entrado na minha vida. A viragem do século foi completamente significante, e os sete anos seguintes foram de "metamorfose". de certo modo, parece que o universo "conspirou" e me conduziu, por vários atalhos, até ao caminho em que hoje me encontro, e sei que há mais caminho para trilhar. Tive o primeiro "burn-out" em 2001, o 2º, em finais de 2008, o mesmo psiquiatra e o mesmo problema que me levou à exaustão e perto, muito perto do abismo da depressão: "pode alguém ser quem não é?". Ter animais à minha responsabilidade foi o muro que me impediu de cair, quando encostei "às boxes" no fim de 2009. E foi também no fim desse ano, quando o meu Blitzen - o 11º gato - adoeceu com PIF, que tomei finalmente consciência da minha própria mortalidade, de nunca haver chão debaixo dos pés, de vivermos sem rede, e aprendi a valorizar cada momento da vida. Percebi que qualquer um dos gatos, qualquer um de nós, "só está vivo enquanto não morre", e compreendi que era preciso viver feliz, sem arrependimentos e sem egoísmo. nada temos que seja realmente nosso, porque partimos como chegámos: sozinhos e sem nada.

Por esta altura já tinha vendido o meu apartamento em Leiria, um óptimo apartamento, um grande t3, no qual me sentia prisioneira de vários passados, e muito cansada. Precisava de espaço e, pasme-se: de instabilidade. Comprei uma casinha no campo para restaurar, e aluguei um apartamento horroroso, mas com renda aceitável e o único onde aceitavam animais, enquanto as obras decorressem. Por esta altura viviam comigo 7 gatos e uma cadela "louca". Já tinha lido tanto nos fóruns, já tinha conhecido tanta gente, não era a coisa mais fácil do mundo mas não era de todo impossível. Alguns amigos já estava longe havia muito tempo, outros afastaram-se porque as afinidades se foram... mas outros ficaram, e outros vieram. O "namorido" recambiado tinha sido o amor da minha vida e ia-me matando. Renunciei a relacionamentos - "era pouco o que tinha, e era pouco o que dava", como escreveu O'Neill - e optei, em consciência, por "viver para os gatos". Uma paixão que ainda dura.

Depois da morte do Blitzen, pensei que ia ficar com 10 gatos - se o PIF não me levasse mais nenhum, mas o destino logo me deu a volta. Veterinários que tinham cuidado do meu pequenino salvaram alguns gatos entregues pelos donos para "abater" e decidiram que ficariam bem comigo. Outros, que de outro modo não teriam hipóteses, mas que acreditei serem recuperáveis, escolhi eu (ou o meu ego), por outros fui escolhida. Tive de ser capaz, as únicas coisas que me eram exigidas eram tempo e dinheiro, e isso eu tinha. O último "burn-out" foi grave, exigiu descanso durante 7 meses, durante os quais vivi quase exclusivamente para os animais, era o que me mantinha de pé e à tona.

No fim de Agosto do ano passado, descobri esta moradia onde agora vivo. A casa que comprei continua com as obras paradas, foi um berbicacho, pertencia a reserva ecológica e claro que não fui informada de tal quando a comprei. O dinheiro para as obras foi gasto nas rendas de casa e a ajudar animais e pessoas - algumas oportunistas, que me descartaram quando as ajudas incondicionais acabaram e tive de deixar de ser generosa. Agora aguardo que os engenheiros das "especialidades" concluam os projectos, para poder pedir a licença de obras... não há pressas.

Sinto-me bem aqui. Completa e feliz, sem necessidades extra a satisfazer. É muito fácil viver apenas com o essencial, e há tão pouca coisa realmente essencial... Não sinto falta de cuidados de manicure, nunca os tive e as unhas de gel passam-me ao lado. Madeixas, são feitas pelo sol, de graça. Um bom perfume não tem de ser caro. O carro, é o mesmo há 16 anos e está para durar. Não me ralo com ostentações de estatutos. Tenho imensa pena que os meus pais se sintam desgostosos e queiram morrer porque não sou a "princesa" que idealizaram, e abandonei os seus sonhos para viver a minha vida. Tenho a meu cargo 33 gatos e 6 cães - já foram 8, mas encontrei bons donos para 2. Queria ter menos cães, bastariam 3, mas os canis e associações estão cheios, as ruas estão cheias, e não os dou para ficarem pior do que estão (nas mãos de "caçadores" ou na ponta de uma corrente). Gostava de lhes dar mais atenção, mas enfim, sempre se têm uns aos outros e os cuidados básicos não lhes faltam. Tenho dificuldades em colocá-los para adopção, porque há tantos a precisar bem mais que não ouso tentar tirar-lhes o lugar. Sim, sinto-me dog hoarder por ter mais cães do que aqueles aos quais poderia dar muito mais, mas a verdade é que não tive outro remédio, e cuido deles porque não tenho outro remédio. Ou tenho, mas não seria ético - tantas vezes me passa pela cabeça deixá-los à porta de uma associação e que se desenrascassem... :oops:

Em relação aos gatos, é diferente. Alguns são bravinhos e prendê-los em casa seria matá-los; apesar disso, comparecem todos os dias, ao serão, alguns já mesmo durante o dia. Se adoecem, deixam-se agarrar e tratar, confiam em mim. Os "de casa" chegam a ser de uma lealdade canina - ou mais - e alguns são mesmo muito dependentes. Tenho muito poucos gatos com saúde frágil, porque não tenho condições para cuidar de vários: prefiro os casos comportamentais. Sei que o amor não chega, porque já dois gatos me morreram de "desamor" - um que perdeu a dona e foi vencido pela lipidose hepática, outro que foi "empandeirado" aos 10 anos de idade e preferiu deixar-se morrer, indiferente ao meu amor e a todos os cuidados do veterinário.

Já sofri muitas perdas e conheço bem a cara da morte, mas cuidar dos vivos dá-me o alento para não me entregar ao luto. Menciono números, mas cada um é único e tem o seu lugar na vida e no meu coração. Eu quero lá saber dos números. Sei que sou , que me tornei "estranha" para muita gente, que me interroga com perguntas como "para que queres tantos? e sabes o nome deles todos?" e "então e as ninhadas?" "ah, mas gastas imenso dinheiro com eles". Pois gasto. Pois... gatos. :) Antes com eles do que comigo, e nunca tive de o pedir a ninguém. Não sei qual é o espanto. Eu é que não compreendo como se compra um LCD que ocupa a parece de uma sala, e não se deita a mão a um ser pelo qual somos responsáveis, porque o cativámos, porque o trouxemos para o nosso meio. Todos somos responsáveis, não importa que não tenhamos sido "nós" a provocar os estragos; compete-nos repará-los, na medida do possível, ainda que no limiar da sanidade. É claro que não prefiro apanhar um animal moribundo e gastar 20 euros a eutanasiá-lo do que ir jantar fora, mas se tiver de escolher, adivinhem? pois...

São opções. A liberdade possível é poder escolher como nos sentimos melhor. Todos queremos o mesmo: evitar a dor, sentir o prazer. As minhas escolhas levam àquilo a que muitos chamam solidão. Se não gostam de mim por ter pêlos na roupa, pois... que dizer? há tanta gente limpa de quem gostar... :)

Eu gosto de mim. Tenho 40 anos, sou professora de artes visuais a menos de 5 km de casa, vivo sozinha com os meus cães e os meus gatos. Vivemos em harmonia. Sou gira, sou culta, boa pessoa e vivo bem sem a aprovação de quem nem sequer tenta compreender. Não dou importância a bens materiais, sou cada vez mais desapegada, não passo necessidades, tenho dias tristes, dias contentes, mas considero-me feliz. E o psiquiatra deu-me alta, mesmo sendo, tecnicamente, uma pet hoarder.
Acredito na Paci&ecirc;ncia, na Persist&ecirc;ncia, no Pai Natal e no Poder do Fiambre!
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quarta jul 13, 2011 3:50 pm

Chamarrita Escreveu:Olá. Chamo-me Susana e, tecnicamente, sou uma pet-hoarder.

Muitos dos meus comportamentos incluem-se no conceito, que é considerado um distúrbio psiquiátrico, uma neurose obsessivo-compulsiva/ distúrbio de ansiedade. Tem tratamento, mas não tem cura. Por algum motivo, mais recente ou mais remoto, foi criado um vazio emocional que a todo o custo é necessário preencher, porque é um vazio que não fecha, e traz um grande sofrimento à pessoa que dele padece.

Ao contrário de outras obsessões/compulsões (viver para o trabalho/a carreira, ser activista de direitos humanos, ser artista, seguir a vida monástica, entre outros), esta - a de viver com um elevado número de animais, sacrificando aquilo a que chamam "vida pessoal" - é socialmente inaceitável. A família desaprova, os amigos afastam-se. Talvez sintam que deixou de haver lugar para eles. E a "maluquinha dos gatos de dos cães" fica cada vez mais só e mais livre para exercer a sua "loucura". A CatLady dos Simpsons é um bom exemplo desta perturbação em "roda livre".

Voltando a mim, e apesar de ainda não ter atingido tais extremos, uma vez colado o "rótulo" é difícil retirá-lo. E os gatos/cães tornam-se os bodes expiatórios sobre os quais recaem todas as culpas, são a eles atribuídas as causa de todos os "problemas"... Toda a situação é vista pelo lado negativo e passamos a vida a dar "desgostos" a quem nos quer bem, a desiludir, a frustrar expectativas.

No meu caso, o problema de vazio/ obsessão/ ansiedade não é de agora, embora o "acumular" de animais seja relativamente recente. Desde bebé que me lembro de adorar animais e sempre os ter tido como companheiros na solidão de uma infância de filha única. Um de cada vez, e sempre cães.

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O Chuchu foi o "meu" primeiro cão. Na verdade não era meu, era da minha tia, com quem eu passava os dias até a minha mãe deixar de trabalhar e passar a viver em função de mim, numa profissão de "mãe a tempo inteiro". O Chuchu era o meu grande amigo e protector, chamava a minha tia quando eu acordava, roubava brinquedos e chupetas a outros bebés quando ia à rua e oferecia-mos. Mas eu era muito pequenina e as lembranças que guardo, conscientes, resumem-se a fotografias, histórias que me contaram e alguns brinquedos que resistiram ao tempo. Mais tarde tive os meus próprios cães: o Paco, rafeiro amarelo teimoso como um burro que nunca conseguiu aprender a andar de trela e que desapareceu (porque os meus pais achavam bem que o cão andasse na rua sozinho...); o Pluto, cruzado de cocker, inteligentíssimo, oferecido ao meu pai "com as vacinas" mas sem nenhum boletim de saúde, e veio a morrer com esgana, ainda bebé. Durante mais de meio ano tive pesadelos e chorei pelo meu Pluto. O terceiro cão que tive com os meus pais foi um "acanichado", o Black, resultado de uma conspiração com o meu pai (e contra a vontade da minha mãe, que nunca gostou lá muito de animais e sabia que ia "sobrar" para ela...). Com o Black, sendo eu mais velhinha, já pude responsabilizar-me um pouco e garanti, com o dinheiro que me davam, a vacinação completa e anual. Jurei, depois do Pluto, que nenhum animal a meu cargo morreria ou viria a sofrer por doenças perfeitamente evitáveis, e a promessa mantém-se cumprida. O Black morreu com 13 anos, suspeito que tenha sido cancro, pois os meus pais recusaram a necrópsia. Eu já não estava em casa, comecei a trabalhar cedo e, quando recebi a notícia, já tinha sido enterrado. No fim de semana antes da sua morte tentei convencer os meus pais a adormecê-lo, mas não tiveram "coragem", nunca o tinham feito, não iriam fazê-lo e não consegui impôr-me. Não sei se é ou não verdade, mas contaram-me, com confirmação de uma vizinha, que o Black morreu a dormir. Eu estava no meu primeiro ano de serviço, a dar aulas pela primeira vez, e não podia faltar "por causa de um cão". Mais um juramento feito: que nenhum animal meu iria sofrer esperando pela morte.

Dois anos mais tarde surgiu aquela que foi a minha grande companheira de longos anos, a Tonta. Baixinha, comprida, de pata curta, orelhas enormes, fugia de uns garotos que a apedrejavam e veio ter comigo. Protegi-a, dei-lhe água, mas não comida, porque isso significaria "assinar um contrato" para o qual ainda não estava preparada. Mas a minha senhoria, que vivia no andar de baixo da casa que eu tinha alugado, tratou do assunto, e a cadelinha ficou por ali. Como a alimentação era de restos, comecei a comprar-lhe ração, mas havia o problema dos fins de semana, em que ia a Coimbra, e os meus pais não queriam lá a cadela. Ainda se fosse macho... :roll: Preocupada, tratei de lhe arranjar um dono, e um colega aceitou ficar com ela. Só que... passados poucos dias a Tonta fugiu, e veio ter comigo outra vez. Fui escolhida e não havia nada a fazer. O meu colega devolveu-me os seus pertences e eu levei a Tonta ao veterinário, para iniciar o plano de vacinação e a assumir como "minha". Tomou a sua banhoca (foi um festival, com duas pessoas a segurarem enquanto eu tentava lavá-la) e passou a entrar em casa e permanecer. Sempre foi uma "senhora", uma cadelinha exemplar. A família acabou por aceitá-la, apesar de tresandar a cão e largar pêlo como nunca vi. Depois de 3 anos comigo e algumas pseudogestações e injecções para evitar o cio (sabia lá eu das esterilizações...), acabou por ter uma piómetra - emprenhou, sei lá eu como, e os fetos mumificaram - e foi esterilizada. Long story, que a Tonta viveu comigo 14 anos, foi ao meu casamento, assistiu ao meu divórcio, enfim... uma vida longa, e ajudei-a a partir no dia 10 de Outubro de 2007.

E até agora, nada de gatos, não é? :)

Embora eu ache que ser filha única terá sido um pequeníssimo contributo para ser hoje uma catlady, conheço imensa gente com irmãos, com filhos, enfim, sem nenhuma razão válida para o sentimento de solidão. E eu, na verdade, nunca me senti sozinha, embora me sinta muitas vezes incompreendida... mas aprendi a viver com isso.

No último ano de vida da Tonta, depois ter sido submetida a uma mastectomia parcial devido a tumores, com cerca de 18 anos de idade, estava em vias de me "amigar" com um moço que sempre tinha sido "dos gatos". Comecei a pensar em adoptar uma gatinha, apesar de sempre ter sido "dos cães", mas alguns gatos passarem fugazmente na minha vida e sempre me tinham fascinado. Só que a minha família não gostava de gatos (traiçoeiros, falsos, etc) e por isso nunca tive grandes oportunidades de convívio, além de ter uma série de preconceitos e ideias erradas sobre estes seres admiráveis. E, um belo domingo de Maio, estava eu na barraquinha da AZL, na feira anual de Leiria, apareceu um casal com um saco de gatos - literalmente, um saco de serapilheira - com cerca de 2 mesitos. Eram 5 e bastante engraçadinhos, excepto uma "trombudazinha" que ficou num canto da jaula a olhar para mim, enquanto os irmãos brincavam e lutavam pela atenção de uma das voluntárias. Acabei por pegar na trombuda ao colo, ela subiu para os meus ombros e meteu-se no capuz do casaco, onde adormeceu. A tarde passou, tinha de ir para casa e tencionava devolver a gata à jaulinha, mas quem diz q ela me largou? Olhou para mim, bem dentro dos olhos, e miou "mamã". Juro. E com ela assim, de unhas espetadas no meu peito, foi comprar uma transportadora em vime na barraquinha ao lado, e levei a Chamarrita para casa. E a minha vida mudou... 8)

O moço veio lá dos Açores, amigámo-nos mas as coisas não correram muito bem. Em Outubro, com o falecimento da Tonta, a Chamarrita ficou sozinha e os problemas começaram. Ele não queria a gata a andar pela casa toda (a MINHA casa, onde ele era convidado), e fechava-a quando eu ia trabalhar. Comprámos uns sofás XPTO, que a Chamarrita começou a arranhar APENAS na presença dele, e fui percebendo que ele valorizava mais as coisas do que os afectos. Ela provocava-o indecentemente, e fez com que se fosse revelando... até que um dia me deu a escolher: "ou eu, ou a gata!". E eu fiz a escolha certa, claro...

Logo no início desse ano de 2008, e porque a Chamarrita me foi ensinando a conhecer e amar os gatos, conheci e registei-me num fórum vizinho, o Felinus, para aprender um pouco mais. No princípio de Março, logo no 1º dia, o rapaz foi "desconvidado" e recambiado para a saia da mãe, de onde nunca devia ter saído e, nessa mesma noite, comecei a procurar um companheiro para a minha gatinha, que iria ficar sozinha grande parte do dia. Encontrei: um gato pardo, tigrado, grande, muito, muito meigo, com cerca de 2 anos, que havia sido "vendedor de castanhas" na baixa de Lisboa. Fui buscá-lo e conheci a sua FAT, uma dessas "maluquinhas dos gatos" que "dava sentido à vida" resgatando animais da rua, mas afinal... era uma pessoa "normal", um ser humano fantástico, uma mulher equilibrada e sã, culta, que conseguia perfeitamente conciliar a sua vida social e profissional com a ajuda aos animais, e "independente", apesar de cooperar com associações diversas. Desde logo ganhou a minha amizade e admiração.

Mas, poucos anos antes, já a minha vida e as minhas perspectivas tinham começado a mudar, mesmo antes da Chamarrita ter entrado na minha vida. A viragem do século foi completamente significante, e os sete anos seguintes foram de "metamorfose". de certo modo, parece que o universo "conspirou" e me conduziu, por vários atalhos, até ao caminho em que hoje me encontro, e sei que há mais caminho para trilhar. Tive o primeiro "burn-out" em 2001, o 2º, em finais de 2008, o mesmo psiquiatra e o mesmo problema que me levou à exaustão e perto, muito perto do abismo da depressão: "pode alguém ser quem não é?". Ter animais à minha responsabilidade foi o muro que me impediu de cair, quando encostei "às boxes" no fim de 2009. E foi também no fim desse ano, quando o meu Blitzen - o 11º gato - adoeceu com PIF, que tomei finalmente consciência da minha própria mortalidade, de nunca haver chão debaixo dos pés, de vivermos sem rede, e aprendi a valorizar cada momento da vida. Percebi que qualquer um dos gatos, qualquer um de nós, "só está vivo enquanto não morre", e compreendi que era preciso viver feliz, sem arrependimentos e sem egoísmo. nada temos que seja realmente nosso, porque partimos como chegámos: sozinhos e sem nada.

Por esta altura já tinha vendido o meu apartamento em Leiria, um óptimo apartamento, um grande t3, no qual me sentia prisioneira de vários passados, e muito cansada. Precisava de espaço e, pasme-se: de instabilidade. Comprei uma casinha no campo para restaurar, e aluguei um apartamento horroroso, mas com renda aceitável e o único onde aceitavam animais, enquanto as obras decorressem. Por esta altura viviam comigo 7 gatos e uma cadela "louca". Já tinha lido tanto nos fóruns, já tinha conhecido tanta gente, não era a coisa mais fácil do mundo mas não era de todo impossível. Alguns amigos já estava longe havia muito tempo, outros afastaram-se porque as afinidades se foram... mas outros ficaram, e outros vieram. O "namorido" recambiado tinha sido o amor da minha vida e ia-me matando. Renunciei a relacionamentos - "era pouco o que tinha, e era pouco o que dava", como escreveu O'Neill - e optei, em consciência, por "viver para os gatos". Uma paixão que ainda dura.

Depois da morte do Blitzen, pensei que ia ficar com 10 gatos - se o PIF não me levasse mais nenhum, mas o destino logo me deu a volta. Veterinários que tinham cuidado do meu pequenino salvaram alguns gatos entregues pelos donos para "abater" e decidiram que ficariam bem comigo. Outros, que de outro modo não teriam hipóteses, mas que acreditei serem recuperáveis, escolhi eu (ou o meu ego), por outros fui escolhida. Tive de ser capaz, as únicas coisas que me eram exigidas eram tempo e dinheiro, e isso eu tinha. O último "burn-out" foi grave, exigiu descanso durante 7 meses, durante os quais vivi quase exclusivamente para os animais, era o que me mantinha de pé e à tona.

No fim de Agosto do ano passado, descobri esta moradia onde agora vivo. A casa que comprei continua com as obras paradas, foi um berbicacho, pertencia a reserva ecológica e claro que não fui informada de tal quando a comprei. O dinheiro para as obras foi gasto nas rendas de casa e a ajudar animais e pessoas - algumas oportunistas, que me descartaram quando as ajudas incondicionais acabaram e tive de deixar de ser generosa. Agora aguardo que os engenheiros das "especialidades" concluam os projectos, para poder pedir a licença de obras... não há pressas.

Sinto-me bem aqui. Completa e feliz, sem necessidades extra a satisfazer. É muito fácil viver apenas com o essencial, e há tão pouca coisa realmente essencial... Não sinto falta de cuidados de manicure, nunca os tive e as unhas de gel passam-me ao lado. Madeixas, são feitas pelo sol, de graça. Um bom perfume não tem de ser caro. O carro, é o mesmo há 16 anos e está para durar. Não me ralo com ostentações de estatutos. Tenho imensa pena que os meus pais se sintam desgostosos e queiram morrer porque não sou a "princesa" que idealizaram, e abandonei os seus sonhos para viver a minha vida. Tenho a meu cargo 33 gatos e 6 cães - já foram 8, mas encontrei bons donos para 2. Queria ter menos cães, bastariam 3, mas os canis e associações estão cheios, as ruas estão cheias, e não os dou para ficarem pior do que estão (nas mãos de "caçadores" ou na ponta de uma corrente). Gostava de lhes dar mais atenção, mas enfim, sempre se têm uns aos outros e os cuidados básicos não lhes faltam. Tenho dificuldades em colocá-los para adopção, porque há tantos a precisar bem mais que não ouso tentar tirar-lhes o lugar. Sim, sinto-me dog hoarder por ter mais cães do que aqueles aos quais poderia dar muito mais, mas a verdade é que não tive outro remédio, e cuido deles porque não tenho outro remédio. Ou tenho, mas não seria ético - tantas vezes me passa pela cabeça deixá-los à porta de uma associação e que se desenrascassem... :oops:

Em relação aos gatos, é diferente. Alguns são bravinhos e prendê-los em casa seria matá-los; apesar disso, comparecem todos os dias, ao serão, alguns já mesmo durante o dia. Se adoecem, deixam-se agarrar e tratar, confiam em mim. Os "de casa" chegam a ser de uma lealdade canina - ou mais - e alguns são mesmo muito dependentes. Tenho muito poucos gatos com saúde frágil, porque não tenho condições para cuidar de vários: prefiro os casos comportamentais. Sei que o amor não chega, porque já dois gatos me morreram de "desamor" - um que perdeu a dona e foi vencido pela lipidose hepática, outro que foi "empandeirado" aos 10 anos de idade e preferiu deixar-se morrer, indiferente ao meu amor e a todos os cuidados do veterinário.

Já sofri muitas perdas e conheço bem a cara da morte, mas cuidar dos vivos dá-me o alento para não me entregar ao luto. Menciono números, mas cada um é único e tem o seu lugar na vida e no meu coração. Eu quero lá saber dos números. Sei que sou , que me tornei "estranha" para muita gente, que me interroga com perguntas como "para que queres tantos? e sabes o nome deles todos?" e "então e as ninhadas?" "ah, mas gastas imenso dinheiro com eles". Pois gasto. Pois... gatos. :) Antes com eles do que comigo, e nunca tive de o pedir a ninguém. Não sei qual é o espanto. Eu é que não compreendo como se compra um LCD que ocupa a parece de uma sala, e não se deita a mão a um ser pelo qual somos responsáveis, porque o cativámos, porque o trouxemos para o nosso meio. Todos somos responsáveis, não importa que não tenhamos sido "nós" a provocar os estragos; compete-nos repará-los, na medida do possível, ainda que no limiar da sanidade. É claro que não prefiro apanhar um animal moribundo e gastar 20 euros a eutanasiá-lo do que ir jantar fora, mas se tiver de escolher, adivinhem? pois...

São opções. A liberdade possível é poder escolher como nos sentimos melhor. Todos queremos o mesmo: evitar a dor, sentir o prazer. As minhas escolhas levam àquilo a que muitos chamam solidão. Se não gostam de mim por ter pêlos na roupa, pois... que dizer? há tanta gente limpa de quem gostar... :)

Eu gosto de mim. Tenho 40 anos, sou professora de artes visuais a menos de 5 km de casa, vivo sozinha com os meus cães e os meus gatos. Vivemos em harmonia. Sou gira, sou culta, boa pessoa e vivo bem sem a aprovação de quem nem sequer tenta compreender. Não dou importância a bens materiais, sou cada vez mais desapegada, não passo necessidades, tenho dias tristes, dias contentes, mas considero-me feliz. E o psiquiatra deu-me alta, mesmo sendo, tecnicamente, uma pet hoarder.
Olá Susana, sou a Mafalda e se já era sua fã, mais fiquei. Parabéns pela frontalidade, pelas escolhas, pela liberdade de ser quem bem lhe aprouver sem dar satisfações a ninguém. Acho-a mais sã do que quase toda a gente que conheço e que vive em função do que os outros pensam, da ostentação, dos luxos, etc, etc...
<p>"Os c&atilde;es podem vir quando s&atilde;o chamados; os gatos anotam a mensagem e voltam a ligar mais tarde."</p>
<p>&nbsp;Mary Bly </p>
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 4:11 pm

Vivemos em harmonia. Sou gira, sou culta, boa pessoa e vivo bem sem a aprovação de quem nem sequer tenta compreender. Não dou importância a bens materiais, sou cada vez mais desapegada, não passo necessidades, tenho dias tristes, dias contentes, mas considero-me feliz. E o psiquiatra deu-me alta, mesmo sendo, tecnicamente, uma pet hoarder.
Sou a Luisa, nunca seria pet-hoarder, preciso dormir e pasmar para outras coisas, sou mandriona de mais para tanta obrigação e trabalho. Mas quem encontra a felicidade sem pisar ninguém, nem animais é digno de ter alta, mesmo que sejamos todos um pouco loucos, há loucuras que dá gosto ler.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
<p>Tourada n&atilde;o &eacute; tradi&ccedil;&atilde;o, &eacute; crueldade- Assine aqui, divulgue e ajude a acabar com esta viol&ecirc;ncia</p>
Arguidaa
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quarta jul 13, 2011 4:13 pm

Chamarrita, muitos parabéns pela HONESTIDADE e FRONTALIDADE. :wink: Um relato que não nos deixa de forma alguma indiferentes ... bem pelo contrário.
LuMaria
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quarta jul 13, 2011 4:21 pm

E uma correcção, não é uma pet-hoarder. Quanto muito, é uma coleccionadora.
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
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LuMaria
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quarta jul 13, 2011 4:26 pm

Mas pensando racionalmente chamarrita, se ficar doente, tem quem a ajude a cuidar deles? Não é altura de começar a dizer não?
<p> At&eacute; Sempre... A quest&atilde;o n&atilde;o &eacute;, eles pensam? Ou, eles falam? A quest&atilde;o &eacute;, eles sofrem!&nbsp;</p>
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tiabela
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quarta jul 13, 2011 4:56 pm

Arguidaa Escreveu:Chamarrita, muitos parabéns pela HONESTIDADE e FRONTALIDADE. :wink: Um relato que não nos deixa de forma alguma indiferentes ... bem pelo contrário.
Concordo !
Um relato para refletir

Nota: adorei o ChuChu e a Chamarrita era uma graça de bébé :wink:
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